Uma das organizações afetadas pelas primeiras medidas de Donald Trump no governo foi a Usaid, ou a Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional. Como muitas outras iniciativas federais americanas, os fundos dela foram congelados por 90 dias para passar por revisão.
Mais recentemente, no entanto, o bilionário Elon Musk começou uma campanha para extingui-la totalmente, acusando-a até mesmo de ser uma organização criminosa.
Seus comentários sucedem o afastamento de diversos funcionários da Usaid após estes se recusarem a conceder acesso a sistemas internos a funcionários do Doge (Departamento de Eficiência Governamental), órgão que o dono da Tesla e da SpaceX chefia.
Apesar do nome, o Doge não é um departamento propriamente dito, e sim uma equipe dentro do governo. Ela foi desenhada para buscar maneiras de cortar gastos federais.
Os decretos de Trump englobaram verbas que a Usaid destina a ONGs de todo o mundo, inclusive no Brasil —cerca de 160 nações foram beneficiadas pelos programas da agência em 2023 —Ucrânia (US$ 17 bi), Israel (US$ 3,3 bi), Jordânia (US$ 1,7 bi), Egito (US$ 1,5 bi) e Etiópia (US$ 1,6 bi) foram as que mais receberam recursos.
Até mesmo países que não mantêm relações diplomáticas com os EUA já foram contemplados com os investimentos americanos. No passado, Irã e Coreia do Norte estiveram, por exemplo, no leque de atividades exercidas pela agência.
O presidente John F. Kennedy fundou a Usaid em 1961, com o intuito principal de centralizar e promover a ajuda externa dos EUA. À época, ela reuniu um rol de programas de assistência estrangeira que já estavam em vigor.
Ao longo das décadas, segundo diz o portal da própria agência, a organização ampliou seu escopo de atuação para promover “necessidades humanas”, como nutrição e educação, além de estimular a democracia e mercados livres.
Desde a década de 1990, o maior foco da agência foi a área da saúde. De acordo com os relatórios anuais, o setor foi alvo da principal parcela do investimento até 2022, no contexto da pandemia de Covid-19. Os esforços da agência também são historicamente vinculados à luta contra a Aids —em 2019, os investimentos da organização contribuíram para fornecer testes de HIV para mais de 79,6 milhões de pessoas.
Depois, com a decisão dos EUA de apoiarem a Ucrânia na guerra contra a Rússia, a agência passou a investir mais em outras áreas de assistência humanitária, como desenvolvimento social, educação e outros.
Em 2023, ela investiu quase US$ 44 bilhões em ajuda externa —o valor representa menos de 1% do orçamento federal e cerca de 60% da verba para assistência estrangeira dos EUA.
A Usaid ainda organiza iniciativas paralelas com objetivos específicos. Também em 2023, o seu Programa Alimentos para a Paz movimentou mais de 1,1 milhão de toneladas de alimentos provenientes de produtores americanos. Os esforços visavam a fornecer assistência alimentar a populações de países em desenvolvimento.
Dessa forma, especialistas dizem que a Usaid é uma importante ferramenta de “soft power” dos EUA, permitindo que o país esteja presente de maneira amigável em uma série de países ao redor do mundo, incluindo aliados estratégicos de Washington e até mesmo adversários.
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Na noite do último domingo (2), o republicano afirmou que a Usaid era administrada por “um bando de lunáticos radicais” que seriam expulsos. Musk fez coro em uma publicação no X: “A Usaid é uma organização criminosa. É hora de ela morrer”.
No início do mês, o Departamento de Estado anunciou o congelamento total das verbas destinadas à organização. De acordo com a ordem do presidente, a intenção era analisar se ações praticadas eram “eficientes e consistentes com a política externa dos EUA sob a agenda do ‘América Primeiro'”.
Após a repercussão, o secretário Marco Rubio —que anunciou nesta segunda (3) ter assumido interinamente o controle da agência— assinou uma ordem que retoma a parte dos investimentos que se destina a “programas existentes de assistência humanitária que salvam vidas”.
Na prática, o corte de verbas levou à interrupção no fornecimento de medicamentos do tratamento de HIV, malária e tuberculose. No Paquistão, por exemplo, as equipes foram orientadas a suspender o trabalho em vários projetos, incluindo a reconstrução de delegacias de polícia danificadas por enchentes no fim do ano passado.
Trump afirmou, também no domingo, que seu governo tomará uma decisão quanto à agência nos próximos dias. Membros do Partido Democrata exigiram uma carta da administração que reconheça a independência e o trabalho da Usaid. Dentro do governo, existem relatos de uma possível fusão ao Departamento de Estado —o que a oposição entende como prejudicial ao seu funcionamento.